Sinopse: Marie-Laure vive em Paris, perto do Museu de História Natural, onde seu pai é o chaveiro responsável por cuidar de milhares de fechaduras. Quando a menina fica cega, aos seis anos, o pai constrói uma maquete em miniatura do bairro onde moram para que ela seja capaz de memorizar os caminhos. Na ocupação nazista em Paris, pai e filha fogem para a cidade de Saint-Malo e levam consigo o que talvez seja o mais valioso tesouro do museu. Em uma região de minas na Alemanha, o órfão Werner cresce com a irmã mais nova, encantado pelo rádio que certo dia encontram em uma pilha de lixo. Com a prática, acaba se tornando especialista no aparelho, talento que lhe vale uma vaga em uma escola nazista e, logo depois, uma missão especial: descobrir a fonte das transmissões de rádio responsáveis pela chegada dos Aliados na Normandia. Cada vez mais consciente dos custos humanos de seu trabalho, o rapaz é enviado então para Saint-Malo, onde seu caminho cruza o de Marie-Laure, enquanto ambos tentam sobreviver à Segunda Guerra Mundial.Uma história arrebatadora contada de forma fascinante. Com incrível habilidade para combinar lirismo e uma observação atenta dos horrores da guerra, o premiado autor Anthony Doerr constrói, em Toda luz que não podemos ver, um tocante romance sobre o que há além do mundo visível. (Skoob)
DOERR, Anthony. Toda luz que não podemos ver. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2015. 528 p.
Não é difícil encontrar na
literatura exemplos de livros que têm como pano de fundo a Segunda Guerra
Mundial. Todo o horror desse momento da História provocou feridas profundas
que, em alguns casos, perduraram por todas essas décadas. Como consequência, é
comum que esses fatos sejam relembrados e debatidos até hoje.
Diferente da maioria dos livros
que se passam nessa época, porém, Toda
luz que não podemos ver traz uma premissa improvável, mas que funciona
maravilhosamente bem, já que foge do padrão de se restringir à visão alemã,
inglesa ou judia. Anthony Doerr define seus protagonistas inusitados: uma
garota francesa cega que tem de fugir de Paris no começo da guerra e um garoto
alemão que, para fugir de um futuro de trabalho sob as minas de sua cidade,
termina por usar seus conhecimentos com rádios no exército alemão antes mesmo
de completar seus dezoito anos.
O livro intercala capítulos
curtos narrados em terceira pessoa pelos pontos de vista dos dois personagens
principais, que em certo momento da obra se cruzam. Além deles, a partir da
metade do livro, aparece ainda um terceiro personagem, que é o responsável pelo
suspense que leva ao ápice da história. Essa construção veloz dá impulso à leitura,
já que um capítulo incentiva a leitura de outro, e quando se percebe as mais de
quinhentas páginas do livro se desfizeram sob os olhos.
"[...] O tempo é algo escorregadio: segure-o com firmeza, ou seu encadeamento pode escoar de suas mãos para sempre."
Também, a escrita do autor tem
um toque poético, romântico, mesmo nas cenas mais cruéis. Isso porque os
personagens buscam por lembranças, misturam sensações, refletem sobre os
acontecimentos sempre com um toque de inocência e de nostalgia. São crianças,
praticamente, que têm de lidar com situações arriscadas, com jogos de poder,
com adultos ambiciosos. E, ainda que seja duro para os dois passar por todas as
dificuldades que precisam passar, as suas essências se mantêm.
Eu gostei de cada personagem
criado por Doerr, mesmo aqueles sem qualquer caráter. Todos eles tinham certa
verdade consigo, todos queriam apenas sobreviver à guerra; a diferença é que
uns passavam por cima dos seus semelhantes, outros não. Os personagens mais
valorosos, por sua vez, tinham todos uma doçura que amoleceram o coração:
madame Manec, Frau Elena, Etienne, Daniel LeBlanc, Frederick, Volkheimer e
todos os outros.
Werner tinha consigo aquela
insegurança da infância, que o impedia de pensar sobre os acontecimentos e
fazer qualquer coisa além do que era ordenado a fazer; isso quase me fez
acreditar que ele seria mais uma máquina de guerra sem pudor. Fui enganada,
porém, e fiquei extremamente feliz com isso. Ele tentava, na verdade, não ver,
mas quando percebeu o quanto isso poderia custar, decidiu mudar.
Marie-Laure, diferentemente,
sempre fez o que era preciso fazer. Mesmo sem enxergar, lutou, de forma
silenciosa, por aquilo em que acreditava. Eu me inspirei muito com a personagem,
que me emocionou por diversas vezes, especialmente quando demonstrava seu modo
colorido de ver o mundo, ainda que na verdade não o visse.
"Abram os olhos e vejam o máximo que puderem antes que eles se fechem para sempre."
Toda luz que não podemos ver é
um livro doce sobre a guerra, delicado, e apesar de ter aqui e ali alguns
pontos de escuridão, transborda em cores e em luz.