O Ceifador - Neal Shusterman

Sinopse: Primeiro mandamento: matarás.
A humanidade venceu todas as barreiras: fome, doenças, guerras, miséria... Até mesmo a morte. Agora os ceifadores são os únicos que podem pôr fim a uma vida, impedindo que o crescimento populacional vá além do limite e a Terra deixe de comportar a população por toda a eternidade. Citra e Rowan são adolescentes escolhidos como aprendizes de ceifador - papel que nenhum dos dois quer desempenhar. Para receberem o anel e o manto da Ceifa, os adolescentes precisam dominar a arte da coleta, ou seja, precisam aprender a matar. Porém, se falharem em sua missão ou se a cumplicidade no treinamento se tornar algo mais, podem colocar a própria vida em risco. (Skoob)

Livro recebido como cortesia da Editora
SHUSTERMAN, Neal. O Ceifador. Scythe #1. Seguinte, 2017. 448 p.


A proposta de O Ceifador, de Neal Schusterman, é inusitada e interessante: uma realidade onde a humanidade já superou as doenças e a morte, já alcançou todo o conhecimento possível e a perspectiva de eternidade é quase certa. A única exceção a essa regra são os ceifadores, pessoas escolhidas e treinadas para coletar e manter o crescimento populacional em um nível razoável, que se tornam temidas e idolatradas na mesma medida.

"Não era de admirar que as pessoas fizessem de tudo para agradar os ceifadores. A esperança diante do medo é a motivação mais forte do mundo."

Essa é apenas uma síntese do enredo, que é muito mais amplo e abarca conceitos como a nimbo-cúmulo, a organização da Ceifa, regras de conduta, revivificação e tantas outras coisas que prefiro não explicar aqui, já que a graça é exatamente descobrir durante a leitura. O que realmente importa é que, nesse contexto, Citra e Rowan são escolhidos como aprendizes do ceifador Faraday e precisam aprender a matar, ainda que não gostem da ideia.

O que eu mais gostei em O Ceifador foi a crítica social construída em uma realidade que aparenta ser completamente oposta à nossa, mas na verdade não é. Se imaginarmos que os homens venham a alcançar a imortalidade, provavelmente manterão os verdadeiros males da humanidade consigo, aqueles que estão arraigados na consciência de alguns, e o livro retrata bem isso. Não estou falando aqui da violência e da desigualdade - até porque, no contexto da obra, a desigualdade e a dor foram superadas, o que desestimulou a busca incontrolável existente no sistema capitalista como o vivemos -, mas da crueldade de algumas pessoas e da gana por poder.

Na trama, a única instituição humana não coordenada pela nimbo-cúmulo é a Ceifa, e é claro que alguns se aproveitariam do privilégio de estar "acima" dos outros para se beneficiar. Por isso, há corrupção na organização e há ceifadores que agem fora da lei e matam pelo prazer de matar, com requintes de crueldade, pelo simples fato de que se acham poderosos e de saberem que não podem ser penalizados. Por mais que isso me entristeça, acho que, se a humanidade chegasse ao ponto da história do livro, algo semelhante realmente poderia acontecer; mas é claro que, como um espelho da realidade atual, também existem pessoas que lutam por uma sociedade mais justa, como é o caso de Citra e Rowan.

"Ela queria lhe dizer o quanto o admirava pelo que havia feito. Escolher a compaixão em vez do dever. Havia uma lição a ser aprendida em todas as coletas, e a de hoje tinha sido inesquecível. O caráter sagrado da lei... e o bom senso de saber quando ela deve ser quebrada."

A construção da narrativa e dos personagens foi feita de uma forma instigante, e não há como esclarecer o que eu quero dizer se não citar esses dois aspectos do texto em conjunto. Sempre em terceira pessoa, o texto intercala a perspectiva dos aprendizes, inclusive com nuances psicológicas, sem, contudo, analisar outros personagens em seu íntimo. No decorrer da leitura, fica nítida a mudança que o treinamento traz a Citra e Rowan e em sua forma de pensar. Por outro lado, todos os demais personagens são um enigma e várias vezes me questionei sobre a intenção de um ou de outro até ter certeza se era possível confiar neles ou não.

O livro é envolvente e vibrante, e não se torna em nenhum momento cansativo. Não se trata apenas de trechos que contam a organização da sociedade, mas há um bom número de cenas de ação, descrições de treinamentos e até uma pitadinha de romance.

O Ceifador traz ainda algumas outras reflexões interessantes. Uma delas é a questão da imortalidade e da igualdade. Na trama, a humanidade já atingiu sua evolução máxima - não há mais uma finalidade para sair de casa todos os dias para trabalhar, não há mais a esperança de um mundo melhor - e a consequência disso é a sensação de inutilidade que atinge a todos. Num contexto normal, isso resultaria em depressão ou outras doenças psicológicas que, na história, são evitadas pela ciência e pela tecnologia avançadas. 

"- Você sente um pouco... mas é apenas uma sombra do que poderia sentir. Sem a ameaça do sofrimento, não temos como sentir a verdadeira alegria. O melhor que podemos conseguir é uma vida agradável."

Outro aspecto interessante a ser citado é a própria nimbo-cúmulo. Sempre que se pensa em máquinas assumindo consciência, seja nos filmes ou na literatura, imagina-se em uma guerra contra a humanidade, mas o livro traz uma outra possibilidade: a de unir-se a humanidade para solucionar os conflitos existentes, de somar esforços para uma sociedade mais igualitária. Eu, particularmente, nunca tinha pensado a partir dessa perspectiva e gostei da possibilidade.

O Ceifador é uma leitura interessante, não só pelo contexto original e inovador, pelas reviravoltas e emoções que traz, mas também pelas considerações implícitas em seu texto, que tornam um enredo juvenil em algo questionador. 
Ju
Ju

Apaixonada pela leitura desde a infância, tantos livros lidos que é impossível quantificar. Alguém que vê os livros como uma forma de viajar o mundo e lugares mais incríveis que possam ser criados pela imaginação, sem precisar sair do lugar. Tem o blog como uma forma de dividir experiências e, principalmente, as emoções que as leituras despertaram, para compartilhar idéias e aproveitar sugestões de leitura, envolvendo mais e mais pessoas em um mundo onde a imaginação não tem limites.

10 comentários:

  1. Oi Ju
    Estou bem curiosa por este livro, a trama dele parece ser bem diferente e um tema que faz refletir. Gostei da sua resenha, quero muito ler.

    Beijinhos
    https://diariodeincentivoaleitura.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  2. Olá!!
    Estou interessada nesse livro a muito tempo e agora minha vontade de comprá-lo só aumentou. Nunca li uma premissa assim, tenho certeza que vou gostar da leitura, ainda mais por conter reflexões interessantes. Adorei a resenha. Bjos!

    ResponderExcluir
  3. Olá Ju! Doida pra ler esse livro, curto muito esse gênero, trama super interessante e cada resenha que vejo dele me deixa ainda mais curiosa em conferi essa história.
    Bjs

    ResponderExcluir
  4. Oi Ju!!
    Parabéns, a resenha ficou ótima, eu adorei!
    Agora mais do que nunca qro ler O Ceifador!
    Bjs!

    ResponderExcluir
  5. UOU, fiquei aqui lendo a resenha e me questionando sobre tanta coisa. Será que ser um ceifador é ruim? Será que viver a angústia de poder ser escolhida pela morte é bom?
    Um enredo super diferente do que a gente está acostumado. Com pessoas comuns, mas ao mesmo tempo, bem reais. Aja corrupção e a lei do mais forte.
    O amor a família vale uma vida?
    Puxa, quero muito poder conhecer a história!

    ResponderExcluir
  6. Ju!
    Já tinha lido sobre o livro e muito interessada fiquei para fazer a leitura, primeiro porque é uma ficção fantasia bem diferente das que estamos acostumadas a ler por aí e também, porque questiona a sociedade. Se tivéssemos tudo às mãos, como moradia, saúde, vida 'eterna', realmente a sociedade se estagnaria e não iríamos mais em busca de nossos objetivos, seria perfeito por uma parte e por outra, totalmente inadequada.
    O que me deixou mais intrigada foi por saber como é feita a triagem dos ceifadores, já mantém tanto poder...
    Um maravilhoso final de semana!
    “Não saber é o que torna nossa vida possível.” (Lya Luft)
    Cheirinhos
    Rudy
    TOP COMENTARISTA DE JULHO 3 livros, 3 ganhadores, participem.
    http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  7. Quero ler achei bem diferente seria muito bom um mundo assim na realidade, mas teriamos o mesmo problema o excesso de pessoas. Fiquei intrigada em saber qual é o criterio de escolha do Ceifador.

    ResponderExcluir
  8. Achei super diferente a história deste livro e só leio comentários positivos referentes a história, que bom que em nem um momento a leitura se torna cansativa, cada comentário que leio sobre este livro me deixa mais ansiosa para ler ele.

    ResponderExcluir
  9. Que enredo diferente! Acho que nunca li um livro que fosse parecido com esse, achei bem interessante o autor mostrar a humanidade em sua evolução total, apesar de eu particularmente achar que isso jamais poderia acontecer, pois sempre tem algo em que podemos melhorar ou mesmo a evolução natural, mas enfim, nunca pensei como seria se a humanidade conseguisse a imortalidade, achei bem realista o fato de nesse mundo existirem ceifadores e eles exercerem esse trabalho, enfim, o livro parece ser muito bom e estou morrendo de vontade de lê-lo.
    Beijos!

    ResponderExcluir
  10. A resenha ficou ótima, mas não é um livro que curto de ler.

    ResponderExcluir

Agradeço muito sua visita e peço que participe do blog, deixando um recadinho. Opiniões, idéias, sugestões, são muito importantes para fazer o blog cada vez melhor!
Assim que possível, retribuirei a visita.

Beijos, Julia G.