O Conto da Aia - Margaret Atwood

Sinopse: Escrito em 1985, o romance distópico O conto da aia, da canadense Margaret Atwood, tornou-se um dos livros mais comentados em todo o mundo nos últimos meses, voltando a ocupar posição de destaque nas listas do mais vendidos em diversos países. Além de ter inspirado a série homônima (The Handmaid’s Tale, no original) produzida pelo canal de streaming Hulu, o a ficção futurista de Atwood, ambientada num Estado teocrático e totalitário em que as mulheres são vítimas preferenciais de opressão, tornando-se propriedade do governo, e o fundamentalismo se fortalece como força política, ganhou status de oráculo dos EUA da era Trump. Em meio a todo este burburinho, O conto da aia volta às prateleiras com nova capa, assinada pelo artista Laurindo Feliciano. (Skoob)
ATWOOD, Margaret. O Conto da Aia. Editora Rocco, 2017. 368 p.

Escrito em 1985, época em que o termo distopia ainda não era tão familiarizado dos leitores como é hoje em dia, embora já existissem obras desse gênero bem famosas, como O Planeta dos Macacos, A Guerra dos Mundos, Blade Runner, Admirável Mundo Novo, entre outros, O Conto da Aia aborda temas que atingem diversas vertentes do preconceito, racismo, homofobia, totalitarismo, machismo, tudo embalado em uma narrativa cheia de raiva e rancor.

Após três quartos da população feminina ter ficado estéril, devido a doenças sexualmente transmissíveis, além de outras provocadas pela degradação do meio-ambiente, um grupo religioso totalitário aplica um golpe nos EUA, destrói o governo atual e assume o controle do país, mudando, inclusive, o nome para República de Gileade. A primeira coisa que fazem é suprimir os direitos femininos, mas eles também mantém um regime militar extremamente impiedoso e mortífero, além de leis baseadas em um fanatismo religioso que prega o Antigo Testamento Católico. As mulheres que ainda conseguem engravidar, chamadas de Aias, são destinadas a famílias influentes, cuja esposas sejam estéreis.

Existem outras classes de escravidão, uma vez que não existe salário para essas mulheres e elas são mantidas sob cárcere, como as Marthas, que são empregadas domésticas e cozinheiras. As mulheres que não pertencem a famílias influentes e que não podem ter filhos, ou que são lésbicas, são exiladas para locais desconhecidos, chamados de Colônias, onde precisam sobreviver no meio da pobreza e de doenças.

Existem diversas supressões de liberdade e individualidade que são descritas, aos poucos, por Offred, a personagem principal. E, como disse no primeiro parágrafo, sua narrativa é recheada de raiva e rancor, mas também passa pelo medo, pelo desespero, pela repulsa, pela revolta.

O nome Offred é um perfeito exemplo de até onde foi a perda de liberdade. Offred é o nome que a personagem recebe após o regime, após ser presa e doutrinada para obedecer e cumprir suas funções, que quer dizer Of Fred (de Fred), que é o nome do homem da família para onde ela foi enviada para reproduzir, e a quem ela passa a pertencer.

A história utiliza diversas alegorias nos rituais que os personagens são obrigados a realizar, como nas relações sexuais, estupros na verdade, e no parto, que incomodam a ponto de causar uma revolta no próprio leitor. Em algumas partes, fica difícil distinguir até onde as pessoas perderam a capacidade de avaliar o que é insano e o que não é ao viverem da forma que vivem em Gileade.

Nas ruas, médicos que praticavam abortos são enforcados e os corpos deixados pendurados para todos verem. O mesmo com homossexuais ou pessoas que tentaram confrontar o regime totalitário. Não é permitido ler, assistir televisão, com exceção da hora de pronunciamento governamental, a comida é controlada, bem como o dinheiro, os transportes, a comunicação, a movimentação das pessoas. Em todos os lugares podem existir espiões disfarçados, prontos para delatar algo que achem indigno. Furgões negros, chamados de Os Olhos, aparecem do nada e levam embora pessoas que nunca mais aparecem. É um regime de total terror.

Todos esses fatos são narrados por Offred e intercalados com suas lembranças de como era antes do golpe, do marido e da filha pequena que amava e que foram tirados de seu convívio. A esperança de que, de alguma forma, isso mude, é a força que move e mantém a personagem equilibrada e viva.

Também, como disse no primeiro parágrafo, é fácil fazer comparações com nossa própria realidade, como o regime totalitário do oriente médio, a época da ditadura no Brasil, a escravidão colonial, os tribunais de idade média, as perseguições aos judeus, entre outras barbáries históricas. É como se a autora compilasse em uma única história, tudo o que o ser humano fez de abominável nos últimos dois mil anos. E é aterrador constatar como as coisas podem voltar a serem feitas com tanta facilidade.

Sim, porque uma das coisas mais assustadoras da obra é em como o golpe foi iniciado. A autora não descreve que as coisas mudaram de uma hora para a outra. Pelo contrário. Nas lembranças de Offred, é demonstrado como os sinais começam aos poucos, devagar, dias, semanas, meses, atingindo diversas áreas estratégicas da sociedade, até que quando se dá conta do que está acontecendo, já é tarde demais.

O Conto da Aia vai além do gênero distopia. Ele é uma demonstração fidedigna de como o ser humano pode justificar suas atrocidades pela religião, pelo preconceito com gêneros minoritários, pelo machismo pelo sexo mais frágil, e em como, principalmente, ele consegue se adaptar perfeitamente e interagir com essa situação. Assustador!

Tem uma série de TV lançada este ano e que fez enorme sucesso de crítica e público, além de já ter ganho vários prêmios, e estar concorrendo a tantos outros. Mas dela, eu falo em uma postagem exclusiva ;)
Carl
Carl

8 comentários:

  1. Não conhecia o livro e nem sabia sobre a serie! Mas fiquei muito interessada.
    Gostos de livros com temáticas fortes, e que nos fazem parar para pensar realmente nas coisas.
    Quero ler e saber mais sobre todo essa opressão e tirania.
    Ótima resenha!

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  2. Desde que li a primeira resenha sobre este livro que quero lê-lo, infelizmente ainda não tive oportunidade de adquirir a obra, e muito menos de assistir a série, que muitas pessoas disseram estar fiel a obra. Realmente o intuito da estória distópica, e mostrar as atrocidades que o homem pode fazer levando como justificativas, crenças e valores distorcidos, através da religião, machismo, entre outros. Espero que de certa forma, a obra possibilite uma reflexão.

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  3. Já tinha visto o livro e ficado interessada é uma historia de arrepiar os cabelos com tanta crueldade que fazem com as mulheres um verdadeiro absurdo são tratadas como um nada, não deve ser uma leitura fácil pelo que li da resenha já fiquei agoniada, me deu uma aflição só de imaginar as coisas que essas mulheres enfrentam.

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  4. Não conhecia esse livro , é a primeira resenha que leio, mais fiquei realmente interessa em ler, gosto de livros polêmicos que nos faz pensar e refletir, fiquei chocada em como as mulheres eram tratados como objetos de procriação, muito revoltante, mas mesmo assim fiquei muito curiosa com o livro e quero ler!!

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  5. Carl!
    Em época de empoderamento feminino, esse livro parece ser um choque.
    Mesmo que seja uma distopia, ver tamanhas atrocidades serem empretadas as mulheres e aos menos favorecidos, causa certa repugnância.
    A verdade que mesmo com toda 'conspiração' por traz do regime e todo sofrimento, quero ler.
    Desejo uma semana maravilhosa e florida!
    “Para saber uma verdade qualquer a meu respeito, é preciso que eu passe pelo outro.” (Jean-Paul Sartre)
    Cheirinhos
    Rudy

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  6. Já li diversos comentários referentes a este livro, como gosto de livros de distopia, acabei ficando curiosa para ler O Conto da Aia, parece ser uma história muito forte, não sabia que tem uma série de TV lançada este ano, irei aguardar a postagem exclusiva sobre ela. Quem sabe futuramente eu leia O Conto da Aia.

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  7. Olá! Nossa estou doida pra ler esse livro, curto muito um romance distópico, essa sua resenha me deixou ainda mais curiosa em conferi isso tudo que foi dito aqui, assustadora mesmo essa perspectiva de futuro.

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  8. Olá Carlos,

    Esse é um livro que eu quero muito ler, estou super curioso e sua resenha só fez aumentar a minha curiosidade, gosto demais do gênero e tenho certeza que essa obra vai me agradar...abraço.


    http://devoradordeletras.blogspot.com.br/

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