Ninguém nasce herói - Eric Novello

Num futuro em que o Brasil é liderado por um fundamentalista religioso, o Escolhido, o simples ato de distribuir livros na rua é visto como rebeldia. Esse foi o jeito que Chuvisco encontrou para resistir e tentar mudar a sua realidade, um pouquinho que seja: ele e os amigos entregam exemplares proibidos pelo governo a quem passa pela praça Roosevelt, no centro de São Paulo, sempre atentos para o caso de algum policial aparecer. Outro perigo que precisam enfrentar enquanto tentam viver sua juventude são as milícias urbanas, como a Guarda Branca: seus integrantes perseguem diversas minorias, incentivados pelo governo. É esse grupo que Chuvisco encontra espancando um garoto nos arredores da rua Augusta. A situação obriga o jovem a agir como um verdadeiro super-herói para tentar ajudá-lo — e esse é só o começo. Aos poucos, Chuvisco percebe que terá de fazer mais do que apenas distribuir livros se quiser mudar seu futuro e o do país.
NOVELLO, Eric. Ninguém nasce herói. Seguinte, 2017. 384 p.


A realidade de Ninguém nasce herói é absurdamente assustadora, mas, infelizmente, parece cada vez mais possível. Afinal, o que impede o nascimento de um governo totalitário baseado em um fundamentalismo religioso no país quando os extremos estão tão exacerbados? O ódio, afinal, está por toda a parte, gratuito e irracional, contra todo aquele que não se enquadra num "padrão" aceitável. Foi essa a razão que me levou a escolher o livro para leitura e Eric Novello conseguiu criar um enredo bem amarrado e rico, cuja realidade, embora não esteja concretizada, poderia ser real um dia.

O protagonista da trama, Chuvisco, sente que está fazendo sua parte para mudar o mundo ao distribuir livros banidos pelo governo. Quando ele encontra um garoto atacado por uma das milícias urbanas incentivadas pelo governo, sabe que a única coisa certa a fazer é salvá-lo. Chuvisco percebe, então, que distribuir livros pode não ser suficiente para mudar o país, mas qual será o preço disso? Colocar seus amigos e a si mesmo em risco pode resolver as coisas?

"A verdade é que ninguém nasce herói.
Mas isso não nos impede de salvar o mundo de vez em quando."

Narrado em primeira pessoa, o livro traz questionamentos importantes sobre aderir a um sistema em que não se acredita por medo e a coragem de enfrentar as injustiças, ainda que seja por pequenos gestos. A forma como o autor construiu a aura de medo que os personagens enfrentam foi meticulosa, tanto que consegui sentir a tensão como se estivesse naquele momento político, e a crítica velada sobre as pessoas que fingem não ver as atrocidades para se protegerem se assemelhou bastante às demais ditaduras que já vivenciamos no país.

Em minha opinião, o aspecto político do livro foi seu ponto alto, pois trouxe reflexões relevantes sobre opressão, violência, preconceito e a inversão do papel do Estado, que ao invés de defender e proteger, agride seus cidadãos. Aliás, a realidade do livro não difere tanto assim do que o país vivencia hoje, mas mostra quão pior pode ser se deixarmos intolerantes ocuparem papéis tão importantes no poder.

Outro ponto interessante da leitura e que foi bem trabalhado pelo autor foi a diversidade de seus personagens. Gays, negros, transexuais, todos estavam representados no livro e o mais fascinante sobre isso é que o autor conseguiu inseri-los sem pender para um lado preconceituoso nem caricato. Eram pessoas comuns, pessoas incríveis, e, na verdade, o que menos importava neles era como aparentavam ou suas opções sexuais. 

Meu único problema durante a leitura foram as catarses criativas de Chuvisco. O personagem sofre de algum tipo de distúrbio em que confunde fantasia com realidade e, nos momentos mais tensos da trama, a catarse tomava grandes proporções, a ponto de o garoto narrar os acontecimentos como se fosse um super-herói com armadura e tudo o mais. O fato de essas fantasias acontecerem somente na mente de Chuvisco torna a  trama confusa, pois ele descreve situações que não acontecem de verdade. Em alguns pontos, é difícil distinguir o que é realidade ou não - e eu entendo que essa confusão aconteça também na mente do personagem -, mas isso tornou a leitura cansativa para mim a ponto de eu levar dias para concluir um único capítulo. Sei que essa característica do personagem teve relevância para sua construção e para o enredo, mas, no meu caso, foi o grande problema do livro, e sinto que teria gostado muito mais sem esses momentos fantasiosos.

Ninguém nasce herói, apesar de confuso em alguns momentos, foi uma boa leitura, que mostrou a importância de lutar por aquilo em que se acredita e que não é preciso ter grandes poderes para ser herói na vida de alguém.
Ju
Ju

Apaixonada pela leitura desde a infância, tantos livros lidos que é impossível quantificar. Alguém que vê os livros como uma forma de viajar o mundo e lugares mais incríveis que possam ser criados pela imaginação, sem precisar sair do lugar. Tem o blog como uma forma de dividir experiências e, principalmente, as emoções que as leituras despertaram, para compartilhar idéias e aproveitar sugestões de leitura, envolvendo mais e mais pessoas em um mundo onde a imaginação não tem limites.

25 comentários:

  1. Achei legal o jeito dessa história, ainda mais pelo tema político e as coisas que a gente até consegue acreditar que aconteça. Não é impossível né, por mais absurdo que soe...
    A intolerância, preconceito e essas coisas que ele mostra também me chamaram bastante atenção. Só achei doido isso do personagem confundir realidade e fantasia porque pode acabar ficando difícil pra gente entender também. Legal por passar a mesma confusão que ele deve sentir, mas sei lá, meio complicado ali na trama também. Pode ficar cansativo mesmo e dificultar a leitura.
    Mas é um livro que me deixou curiosa, gostei do jeito dele e bom ou não queria ler ao menos pra conhecer melhor essa história.

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  2. Oi! Não ainda a escrita. É interessante o livro se passar no futuro, onde diversos assuntos são abordados como a opressão, por exemplo... Juntamente com críticas políticas.

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  3. Não é um livro que me desperta vontade de ler, mas é um livro totalmente necessário.
    É importante falarmos, abertamente, sobre estas questões políticas. E fazer o possível para que possamos ter um futuro mais tolerante, com empatia e respeito.
    Eric acertou com o tema da história, e espero que muitos possam ler e aprender.

    Beijos

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  4. Oi JU
    Te confesso que este livro não é meu tipo de leitura, mas ainda sim fiquei curiosa pelo enredo e até sua ressalva final me despertou interesse.

    Beijinhos
    https://diariodeincentivoaleitura.blogspot.com.br/

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  5. Olá Ju! Tenho muito medo de que essa situação descrita no livro possa se tornar real. Os temas abordados pelo autor são importantes para causar alguma mudança positiva em nossas mentes. Acho que a mensagem que ele quis transmitir foi de que precisamos fazer algo para mudar essa situação, todos podem ser heróis, mesmo com pequenos atos. Acho que essa divagação do personagem também me incomodaria na leitura, mas em geral o livro parece muito bom. Beijos

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  6. Olá, adoro esses livros que que fazem uma reflexão acerca do futuro de uma nação. Em Ninguém Nasce Herói o autor consegue fazer um paralelo entre a situação futura e presente do país, mostrando as consequências de um governo tirânico. Realmente essas catarses do personagem corroboram para uma leitura mais lenta, porém sem tirar a grandiosidade do universo criado por Novello. Beijos.

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  7. Parece ser interessante mesmo com as partes confusas, deve deixar o leitor refletindo sobre as atitudes do personagem em lutar pelo que acredita, precisamos de mais gente assim como ele na vida real.

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  8. Oi!
    De fato a história do livro trás algo bem parecido com nossa realidade, a opressão, hoje pode parecer pequena, mas não estamos tão longe quando o enredo que o autor montou. Apesar da confusão que o personagem principal trás, eu achei tudo interessante, e isso me faz pensar em como as vezes usamos nossa imaginação para afastar situações ruins, o protagonista também fantasiosos assim!
    Não é um livro que me chamaria atenção de cara, mas tudo que foi abordado, para mim, é mto importante.
    Bj

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  9. Olá! Não é o tipo de leitura que costumo ler, mas é um tema muito importante a opressão, violência e o preconceito é uma realidade, apesar das partes confusas e do personagem ser meio confuso, gostaria de ler!!

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  10. Todas as resenhas que já li deste livro falam a respeito da confusão existente entre o que e realidade, ou apenas delírio do personagem. E acredito que este ponto deixe a leitura cansativa, mas como você mesma citou acredito que isto realmente aconteça em sua mente, esta distorção inseparável, e indistinguível. Porém os temas abordados na obra, sobre política, e algo que me chamou a atenção, e mesmo com alguns pontos negativos, querer ler a obra.

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  11. Já ouvi falar nesse livro mas não me interessei muito em ter essa leitura não Mas valeu a sugestão

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  12. Ju!
    Muito bom ver que o autor criou uma nova realidade para nosso país, que diga-se de passagem, não gostei nadinha, e a analogia com as crises que vivemos, torna o livro até crível, embora seja uma fantasia bem alucinatória, não é não?
    Sempre bom conhecer um novo escritor nacional e que escreve com qualidade.
    Um Novo Ano repleto de realizações!!
    “Para ganhar um ano novo que mereça este nome, você, meu caro, tem de merecê-lo, tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil, mas tente, experimente, consciente. É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre.” (Carlos Drummond de Andrade)
    cheirinhos
    Rudy

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  13. Oi, Ju!!
    Gostei bastante de ver um livro distópico que se passa aqui no Brasil!! O enredo parece ser bem interessante mas achei que Chuvisco tem algumas crises de distúrbio que se parece com esquizofrenia pode deixar o livro bem confuso.
    Bjos

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  14. Olá! Esse livro já está na minha lista! Adoro livros que abordem debates políticos e críticas sociais e achei interessante que o cenário nacional seja o palco para a história. Gosto quando autores brasileiros utilizam o próprio espaço brasileiro nas narrativas, afinal, é o que somos, é a nossa realidade. No caso do livro, é o nosso temor. Achei bem estranho esse ponto que você colocou sobre o narrador ter uns delírios criativos, hahah acho que vou me incomodar com isso também.
    Beijos.

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  15. Olá Ju! Essa é a primeira resenha que leio desse livro, temas super importantes, trama bem interessante, fiquei bastante curiosa em conferi isso tudo que foi dito aqui.
    Bjs

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  16. Gostei do nome do personagem. Chuvisco? É realmente diferente. Apesar de não ser tão ligada a política é difícil não ver o que está acontecendo. O livro aparenta ter um tema bem atual e isso com certeza faz os leitores se identificarem, há não ser é claro que eles estejam como alguns personagens do livro. Fechando os olhos para as coisas que estão acontecendo por comodismo. Muito legal saber que o livro tem essa diversidade e que não é de uma maneira caricata. Além de ser um livro que traz reflexões ele não parece ser triste. Mas não sabia sobre isso de ter essa fantasia nele, essa parte meio confusa, não sei se é algo que eu vou gostar, só lendo pra saber.

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  17. Eu estou aprendendo a gostar de distopias, sabe. Até um tempo atrás, eu passava longe do gênero, mas ultimamente tenho dado mais chance a ele e tenho tido boas surpresas. Adorei a premissa desse livro e, sem dúvidas, entrou para a lista dos que darei uma chance no futuro. Uma distopia nacional, aliás nossa literatura em excelente fase!

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  18. Oii! é uma pena que essa fantasia de chuvisco deixou a leitura cansativa para você, mas gostei muito dos temas que o livro aborda, principalmente sobre política e gostei muito que chuvisco n se conformava com isso e tbm n ficava no comodismo, realmente podemos ser heróis nas pequenas coisas!! O livro parece ser muito bom, espero ter oportunidade de conseguir ler o livro !

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  19. Já me perdi em quantas resenhas deste livro e ele está na lista de desejados tem um tempinho já! Primeiro por ser nacional, segundo, por trazer esse tema de política e luta por tentar melhorar a vida de outras pessoas menos afortunadas.
    Estamos cheios de "Chuviscos" por aí, anônimos ou que gritam sem vergonha ou pudor.
    Espero poder conferir em breve.
    Beijo

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  20. O lance do futuro distante, não parece algo tão distante assim quando paramos pra pensar na nossa realidade :/
    Gosto dessas leituras que colocam em foco a mente perturbada do narrador. Acho narradores não confiáveis sempre muito interessantes. Já faz um tempinho que quero fazer essa leitura, acredito que irei gostar muito.

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  21. Eu já tinha lido algumas resenhas sobre este livro e todas elas mostram um livro delicado e a tua não foi diferente. Este livro com certeza trará uma mensagem, um estimulo, uma esperança. Tenho interesse em ler assim que tiver oportunidade

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  22. Opressão é um tema que faz-se necessário falar, pois é o que mais vemos no mundo e porque não dizer, no Brasil também. Gostei muito da trama que sinto estar bem tratada. Quero ler o livro.

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  23. Realmente... estamos vivenciando uma realidade política e social bastante complicada. A intolerância está em toda parte, inclusive na política. Isso abre muita margem para se debater nosso futuro. E esse livro 'Ninguém nasce herói' é sem duvidas uma das leituras necessárias para que não tomemos as escolhas erradas. O fato de ser retratada no Brasil deve deixar a narrativa muito mais familiar

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  24. Este é um livro que quero ler. Impossível não pensar se acabaremos como no livro, por isso acho que o livro é tão importante, pra incomodar e nos fazer pensar, pensar muito.
    Patricia Queiroz

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